sexta-feira, julho 02, 2010

Aspectos de uma eliminação

Li, vi e ouvi muita coisa sobre Dunga, Copa e Seleção Brasileira nestas últimas semanas e muitas dessas informações me pareceram muito mais um equívoco do que um exercício de bom jornalismo. Entre brigas, críticas e descontroles, muita besteira foi publicada e muita gente boa mostrou um comportamento, no mínimo, pouco delicado.

Vou tentar listar os fatos e os factóides que foram publicados e que colhi por aí, durante navegações mais ou menos a esmo.

1) O padrão de jogo do time: muita gente criticou essa característica do time do Dunga e disse que o "verdadeiro e mágico futebol brasileiro" não pode ser feio, sem criatividade e se fechar, só esperando a oportunidade de contra-atacar. Apesar de não ter o pensamento clássico holandês e achar que o que importa é o resultado (vide os últimos anos de conquistas do meu São Paulo), meu adormecido lado romântico ainda acha que o modelo ideal é o do time de 1982, por que jogava magicamente bonito, mesmo que não tenha ganho. E como o time de Dunga ganhou títulos com esse estilo, mas foi eliminado da Copa quando a coisa apertou, minha conclusão é que, se a "evolução" do nosso futebol aponta para esse lado, o contra-ataque pode mesmo ser uma boa arma, mas precisamos de mais criatividade para tornar essa arma uma coisa letal.

2) A relação com a imprensa: esse o ponto alto (ou baixo, depende do referencial) da relação de Dunga com a mídia. Ele nunca foi muito simpático com a imprensa em geral e assumiu uma posição especialmente hostil em relação à Globo, coisa que aliás deixou muita gente feliz. "Justamente" a Globo que sempre reinou suprema na Copa e esfregava muitas exclusividades na cara das competidoras. Com Dunga esse privilégio acabou, mas isso não justifica a extrema indelicadeza que ele teve com o repórter Alex Escobar, que afirmou que não estava falando com ele quando balançou a cabeça ou fez algum gesto que incomodou o técnico durante uma coletiva. A Globo ficou possessa e partiu para a briga, mas depois as partes de acalmaram, em nome do bem da Seleção.



Até aceito a ideia de que a toda-poderosa Globo não tenha tantos privilégios, mas daí a tratar toda a imprensa como inimiga é algo que beira a insanidade. O mau humor era padrão e qualquer resposta era carregada de raiva e rancor.
Dunga sabia que essa briga lhe custaria caro, ganhando ou perdendo, e agora terá que lidar com as consequências da sua rabugice, ironia, escárnio e até desrespeito.
Na minha opinião, o modelo ideal não é nem esse de embate constante nem o outro, de 2006, onde cada treino era um show onde até se vendiam ingressos. É preciso chegar a um consenso e as partes precisam chegar a ele juntas.
Neste ponto, Dunga foi muito mal.

3) A convocação: como já disse antes, Dunga optou pela continuidade de um modelo iniciado em 2006 e não admitiu mudanças. Essa opção guardava o risco de desprezar quem "chegasse de última hora", casos de Neymar e Ganso, mas ele assumiu o risco, assim como assumiu também a porta fechada para o "craque" Ronaldinho Gaúcho que só começou a jogar quando viu que sua convocação, antes dada como certa, estava mais para ficção do seu irmão e empresário Assis. Dunga chamou apenas aqueles que "fecharam" nos momentos difíceis (vide Olimpíada de 2008) ou aqueles que demonstraram uma compreensão acima da média do significado de estar na Seleção.
Na minha opinião, a intenção de Dunga é bastante louvável já que optou pelo comprometimento, mas talvez pudesse ter lidado com um pouco mais de flexibilidade ao diminuir o número de volantes e adicionar um pouco mais de talento. Eu já disse anteriormente que poderia ter dado certo, mas como não deu, Dunga terá que assumir as consequências.

4) A "solução" para os erros de 2006: Dunga foi nomeado técnico com a missão de escorraçar os baladeiros e acabar com o circo em que se transformou a Seleção, "causas" para o fracasso na Copa da Alemanha.
Conforme mencionei no item sobre a imprensa, ele levou essa missão às últimas consequências e errou o ponto.
Gostei da ideia de trocar a festa pelo comprometimento, mas era preciso buscar uma solução de consenso e não partir para o radicalismo, coisa que ficou provada pelo novo fracasso. Precisamos sentar e chegar ao "caminho do meio", a forma ideal de lidar com a imprensa, os torcedores e até com os adversários.

5) O "patriotismo": outro ponto que foi muito tratado pelos escribas mundo afora. Ou melhor, maltratado, já que se misturou um monte de conceitos e se chegou ao limite do "ame-o ou deixe-o". Se o patriotismo não se resume a colocar uma bandeira no carro durante a Copa, ele também não é exclusividade de quem fica no Twitter falando mal dos torcedores, da Copa, do futebol e até da vida (vide Ed Motta, Danilo Gentili e outros). Ninguém precisa gostar de futebol, mas é preciso comedimento até para ignorar a Copa. Qualquer um tem direito de fazer isso, mas "dungar" quem se importa não é a solução.
Cada um na sua e todo mundo bem!

6) Reações ao "Dunguismo": muitos dos ataques que Dunga recebeu no Twitter, nos jornais, nos sites, na rádio e na TV, me pareceram descabidos e exagerados. Eles tinham cara de birra e não de profissionalismo. Muita gente se melindrou com o tratamento dado pelo Dunga à imprensa e entrou em uma espécie de "cruzada" contra ele. Tudo em Dunga virou sinônimo de erro, de canalhice. Combateu-se exagero com mais exagero e isso contaminou o país inteiro. Eram raras as pessoas que tratavam a questão com comedimento e coerência, como o Juca Kfouri, por exemplo.
Um pouco mais de profissionalismo, por favor.
Se já critiquei os excessos do Dunga, aqui também tenho que criticar esses melindrados. E nesse grupo de melindrados incluo aqueles que reagem com violência a quem criticava o Dunga ou algum aspecto da Seleção.
Um exemplo desse ataque aos críticos foi o que aconteceu com o Casseta Cláudio Manoel (@CManoelCasseta) que teve que lidar com um monte de xingamentos só por que meteu a boca no Dunga. Por mais que eu possa discordar do que ele diz (e civilizadamente discordo), ofender o cara não me parece uma saída inteligente.

7) A eliminação: já falei sobre isso em outro post mas acho legal reforçar que não entendo que perdemos por que o Dunga é mal educado ou por que a Globo fez complô ou ainda por que a Nike "vendeu" a Copa. Perdemos por que não voltamos a campo para o segundo tempo, cometemos alguns erros, sofremos algumas fatalidades e não tínhamos opções no banco para mudar o jogo. Aliás, esportivamente, esse foi o grande pecado do Dunga como técnico, já que como jogador, o cara é um vencedor e mesmo quem não gosta dele pode negar isso.

8) A torcida contra: isso é algo que me incomoda um pouco mais do que devia. Fico achando que é um "abuso" da democracia. Digo isso por que não fico enchendo a paciência de quem não gosta de futebol, por isso não entendo o que leva alguém a encher a minha e a de outros amantes do esporte bretão ao torcer contra o Brasil por não gostar de um ou outro aspecto.
Não gosta de futebol? Maravilha, continua lendo um livro e bebendo vinho.
Gosta, mas acha que tem coisa errada? Maravilha também, faz uma crítica razoável e insiste nela até a coisa mudar.
Mas não fica jogando uruca para a Seleção perder logo. Isso é muito chato.

9) O que fica para 2014: acho que aqui devo fazer mais ou menos um resumo do que falei nos outros itens. Não sei se a "culpa" é do Dunga, da Globo, do Ricardo Teixeira ou da Jabulani, o que sei é que vou continuar gostando de futebol e amando a Copa do Mundo, por isso peço a todos os envolvidos, desde Sua Majestade Real Ricardo I até o mais humilde torcedor que vê o jogo na TV do boteco: nem tanta badalação, nem tanta rabugice, por favor. Somos animais passionais, mas não precisamos nos matar para ganhar e muito menos para torcer. Ok?

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